sábado, 16 de fevereiro de 2008

Quando o limite torna-se espetáculo

Apesar de ter sido escrito em 1935 e ter virado filme em 1969, "A noite dos desesperados" possui uma atualidade surpreendente. Seu nome original é They shoot horses, don't they?, considerada uma das perguntas mais insólitas do século passado.

Escrito pelo jornalista Horace McCoy e dirigido por Sydney Pollack, "A noite dos desesperados" é um retrato da sociedade norte-americana pós-crise de 1929. Pessoas vindas de todo o país participavam de concursos e eventos humilhantes e desgasantes, primeiramente com o objetivo de se tornarem famosos, futuras estrelas de Hollywood. Mas na verdade o faziam em troca de uns poucos trocados, comida ou um lugar para dormir.

Umas dessas atividades eram as maratonas de dança, onde casais passavam dias dançando sem parar, com pequenos intervalos de dez minutos para comer, dormir ou simplesmente ter o direito de ficar parado por míseros minutos que fossem. É a história de uma dessas várias maratonas que é contada no livro. Belas e uma mostra de resistência para os espectadores, eram uma tortura para os paricipantes. Uma versão século XX da politica de pão e circo romana.

Ao ler este livro, é difícil não fazer nenhuma referência a série de "reallity shows" que pipocam pela televisão não só brasileira, mas tambem mundial. Os motivos que levam uma pessoa a querer participar de um "jogo" como esse não são muito diferentes dos motivos que arrastavam participantes para as maratonas de dança dos EUA da década de 1930. A associação com o Big Brother - por mais latente que seja a sensação de já ser um jogo de cartas marcadas - é quase automática. Outro programa, chamado "No Limite", anterior ao Big Brother Brasil, vai na mesma linha.

Mas se no livro o prêmio era uma ponta em algum filme de Hollywood, no Brasil os participantes se contentam com festas, VIP's em camarotes ou ensaios fotográficos sensuais - por uma estranha coincidência, neste atual BBB só há homens e mulheres com corpos considerados perfeitos. Sem falar, é claro, na aversão que possuem aos livros.

Mesmo 70 anos depois, o limite continua a ser motivo para espetáculo. Espetáculo este que tem apenas um dado positivo, o de escancarar o lado obscuro de uma sociedade cada vez mais desumana, materialista e individualista.

Título: A noite dos desesperados
Autor: Horace McCoy
Editora: Sá
Preço e páginas: R$22,90/160 págs.

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